Revista Ide e Anunciai 14. Recordando com fé e gratidão

Bela coincidência: nasci na mesma época que em Roma a Ordem dos Agostinianos Descalços estava planejando a abertura da missão no Brasil com a escolha e depois o envio dos primeiros três confrades em 1948. Para a história, outros confrades italianos, como os doze apóstolos, ao longo dos vários anos deram continuidade à missão. O primeiro grupo saiu de Genova, de navio, saindo do Convento – Santuário della Madonetta, em que, depois de 15 anos, entrei para fazer parte da Ordem, e do qual sai, 30 anos depois para me juntar aos demais já bem ativos no Brasil.

Conta Santo Agostinho no seu famoso livro “As Confissões” que numa noite, numa grande luta espiritual abriu a Bíblia, e a palavra que o Senhor lhe deu, realizou-se imediatamente na vida dele (Rm 13,13). Também num dia de oração abri a Bíblia e encontrei o começo do capítulo 12 do profeta Ezequiel: “filho do homem, prepara a tua bagagem e emigra para um pais estrangeiro”. Na hora não entendi nada, mas lembrei-me, com gratidão” quando os meus superiores, alguns meses mais tarde, pediram-me se eu estava disponível para a missão no Brasil.

Seminário de Cebú – Filipinas.

Tantos sentimentos: alegria, esperança, dedicação, mas também não faltou o medo e a preocupação; partir para o Brasil foi uma aventura. Foi-me falado que fé quer dizer confiar em Deus e “dar um pulo no escuro, mas não no vazio!”
Tentei-me acompanhar com o Frei Francisco Spoto que depois de umas semanas na Itália voltava para o Brasil. Foi a minha segurança, mas só por algumas horas, porque tinha clima de greve improvisa, que justamente começou mais uma vez entre mim e ele; ele viajou e eu fiquei, pegando o mesmo avião na semana seguinte, não sozinho, mas com Deus.
Quando cheguei no Brasil, as casas da Ordem eram três, Santa Rita na cidade do Rio de janeiro, Bom Jardim no interior do Rio de Janeiro, e Ampére no Paraná que tinha sido aberta recentemente. Chegando no Rio de Janeiro, fiquei o tempo necessário para conseguir o Visto, além de me familiarizar com a língua; era justo a época da construção da Igreja de Santa Rita, ajudei a descarregar o granito para o piso da igreja, e ainda celebrei na capelinha anterior como também na favela da Praia de Ramos.

Primeiros seminaristas filipinos.

Meu interesse e minha paixão sempre foram as vocações sacerdotais e religiosas, por isso fiquei bem contente por ser destinado ao Seminário Santo Agostinho de Ampére, recém construído e que tinha acolhido os primeiros 17 meninos, que cursavam o ensino fundamental (5ª a 8ª séries). Quando cheguei em Ampére só tinha 14; acabamos o ano letivo com 10; no ano seguinte, dos velhos voltaram 06, mas nenhum deles chegou à meta. Mas daqueles que entraram no segundo ano, vários hoje são padres. Aumentaram os seminaristas, e duas vezes foi aumentado o seminário e chegou também o tempo para encontrar um lugar para os que iam cursar a Filosofia. A cidade escolhida foi Toledo (PR). Todo começo é difícil, tanto mais quando as perspectivas são grandes, mas Alguém está sempre junto na obra. Parece impossível, mas na primeira viagem para Toledo, nos últimos quinhentos metros, da paróquia do Menino Deus até o lago, (que na época era só um açude e um banhado) na Parigot de Souza, furou três vezes o pneu! Acostumado com isso, não fiquei maravilhado quando anos mais tarde, nas Filipinas, indo para abrir uma nova missão na ilha de Butuan, perto da meia noite tocou o alarme porque o navio tinha pego fogo!

Trabalhei cinco anos em Ampére, dez anos em Toledo, dois anos em Nova Londrina, sempre preocupado com as construções. Em Ampére foi necessário ampliar o seminário; em Toledo e Nova Londrina, tendo que encontrar o terreno para depois construí-los. Foram centenas os adolescentes e jovens que encontrei, ajudando-os a escolher a vida religiosa, sacerdotal e missionária. Fui formador dos seminaristas menores e depois mestre dos noviços por nove anos (nove anos também nas Filipinas com o mesmo cargo). Assim como eu lembro as palavras e o jeito que tinham os meus formadores e mestres, tenho certeza que cada candidato, mesmo quem não perseverou, guardam lembranças das minhas palavras, do meu jeito, e das minhas atitudes. Ao mesmo tempo, quantos amigos, quantos benfeitores, quantos incentivadores e colaboradores encontrei no Brasil nos 17 anos. Na recente viagem por ocasião do Capitulo geral em Toledo, quantos destes encontrei, em Ampére, em Toledo, em Nova Londrina, no Rio de Janeiro e em Bom Jardim. Foi bom ver como tudo progrediu: cidades, nossos seminários e paróquias; as novas missões no Paraguai, no Mato Grosso, em São Paulo, no Paraná; quantos novos confrades que se juntaram aos da primeira época.

Frei Luigi com os primeiros noviços residentes em Nova Londrina (PR).

Diante de tudo isso brota do coração um profundo agradecimento que me faz lembrar o primeiro jornalzinho que comecei em Ampére, cujo título era “Graças a Deus”. Depois veio “Presença Agostiniana” que deu continuidade àquele impresso, alcançando as quatro mil copias. Estava em Nova Londrina quando em Roma estava se decidindo a abertura de uma nova missão na Ásia. Manifestei por escrito a minha disponibilidade, mas segurei o documento por nove dias debaixo da toalha do altar, celebrando a missa todos os dias. Depois da novena levei-o para o correio. Entre vários confrades que apresentaram o pedido eu fui o escolhido. Mais uma vez um pulo na escuro, mas já sabendo que não era no vazio. Num grupo de oração outros abriram a Bíblia, e não era minha, e a passagem doada foi o fim do capítulo anterior, daquela passagem de 17 anos antes, Ezequiel 11: “E a glória do Senhor parou no templo….” parou nas Filipinas sim, com o mesmo trabalho vocacional desenvolvido ao longo destes 23 anos, prestando serviço em dez comunidades e países diferentes, com confrades provenientes de outras nações: Filipinas, Vietnam. Myanmar, Indonésia, Índia, Nigéria; e “a glória do Senhor” será no templo de Aparecida com toda a Província Religiosa de Santa Rita dos Frades Agostinianos Descalços do Brasil celebrando em ação de graças pelos 70 anos. Deo Gratias et Mariae!

Frei Luigi Kerschbamer, oad

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